PROJETO HIGHLANDER
O detetive
Um automóvel comum transita por uma estrada rural, completamente deserta, num final de tarde tranquilo. O inverno trazia dias secos e relativamente quentes, enquanto as noites eram gélidas e estreladas.
A porta da cabana se abre com um rangido seco. O detetive Justo Bonfiglio tira seus calçados, coloca os chinelos e começa a guardar as compras em seus devidos lugares.
Justin escolheu morar em uma cabana isolada. Com uma potente internet via satélite e equipamentos adequados, possui toda a tecnologia necessária para fazer seu trabalho sem ser importunado. Depois de um banho quente e de uma refeição saudável, senta-se na frente do computador e começa a ler suas mensagens.
O detetive possui vários perfis falsos que utiliza nas redes sociais, para poder investigar seus casos sem que descubram sua verdadeira identidade. Para evitar enganos, faz disciplinadamente as leituras e postagens de um perfil de cada vez.
Alguns minutos depois, começa a ler seus e-mails. Recebe dezenas, talvez centenas, todos os dias. Mantém uma pasta para cada caso sendo investigado, e vai salvando suas mensagens nas pastas correspondentes.
Porém, em um determinado momento, uma mensagem chama sua atenção. Era um e-mail enviado por uma grande fabricante de medicamentos em nível mundial, o Laboratório X, pedindo para que viesse com urgência em sua sede, informando que as passagens aéreas já estavam pagas e marcadas para o dia seguinte. O e-mail ainda informava que se tratava de um caso importantíssimo e de alto
sigilo, e que a recompensa por aceitar o caso seria certamente muito mais do que gratificante.
Havia um número de telefone na mensagem. Resolveu ligar para confirmar as informações.
Foi atendido por uma secretária. Explicou a situação e foi transferido imediatamente para a diretoria da empresa. O diretor confirmou os dados e reiterou a urgência e importância de sua presença na sede nao dia seguinte.
Justo agradeceu a confiança e confirmou sua presença. Em seguida, terminou de fazer seu trabalho rotineiro e foi descansar.
No dia seguinte, saiu cedo com uma pequena mala e foi para o aeroporto.
A fábrica de medicamentos
Pouco mais de uma hora depois, estava entrando na recepção da referida empresa fabricante de medicamentos. Foi prontamente recebido. Uma pessoa foi designada para apresentar a fábrica, os diversos laboratórios, as salas de controle de endemias, alguns escritórios e, finalmente, foi encaminhado para a presidência.
O sr. Marlon se apresentou como sendo o presidente da companhia e pediu para que Justo entrasse em seu escritório e se sentasse. Ofereceu água e biscoitos. Justo aceitou a água. O sr. Marlon então prosseguiu:
O maior segredo da história
- Sr. Justo, em primeiro lugar, agradeço imensamente por ter aceitado este caso. Tenho certeza que o sr. deve ter muitas dúvidas a respeito, então vamos direto ao assunto. O sr. já ouviu falar do Projeto Highlander?
- Não sr, nunca ouvi falar a respeito. Do que se trata?
- O Projeto Highlander é uma espécie de competição entre as maiores fabricantes de medicamentos do mundo, obviamente incluindo a nossa. O objetivo do projeto é desenvolver um medicamento que permita prolongar a vida humana.
- Prolongar a vida humana? O quanto?
- Pra sempre.
Justo se assombra com a resposta e, perplexo, pergunta:
- E no que, exatamente, eu poderia ajudar vocês?
- Primeiramente, você deve saber que o laboratório que patentear uma droga que prolongue a vida humana indefinidamente, se tornaria o mais poderoso laboratório do mundo. Talvez a maior empresa do mundo, pois este medicamento seria vendido apenas para uma elite bastante restrita, por um preço simplesmente incalculável. Então, entramos em uma corrida para desenvolver esse produto. É algo como o que aconteceu na Guerra Fria entre os EUA e a URSS para ver quem chegava na Lua primeiro.
- Entendi. Mas... como funcionaria essa questão de prolongar indefinidamente a vida?
- Bom, você deve saber que cada célula do corpo humano possui uma programação própria a respeito de sua longevidade. Cada uma de nossas células já sabe quantos anos de vida o corpo irá durar. Ao chegar a velhice, algumas células entendem que não são mais necessárias e "praticam suicídio". O corpo fica mais lento, há mais dores, a pele enruga, o cabelo enfraquece, os hormônios baixam, baixando também o apetite sexual, o vigor físico e a imunidade, abrindo brechas para surgirem as doenças que por fim irão encerrar a vida do indivíduo. Até aqui você entendeu?
- Sim, creio que sim.
- Agora imagine se um medicamento fosse capaz de enganar o DNA da célula, dizendo pra mesma que o indivíduo está permanentemente com trinta anos de idade. O que você acha que iria acontecer?
- Bom, imagino que o nosso corpo não envelheceria.
- Exatamente. Cada célula de nosso corpo imaginaria que o sujeito tem trinta anos, portanto o corpo da pessoa seria mantido permanentemente com trinta anos de idade, em plena saúde, para sempre, desde que continuasse a tomar o medicamento. Está entendendo?
- Hmmm, começo a perceber a importância deste projeto... Mas por que apenas uma certa elite teria acesso ao medicamento?
- Ora, isso é óbvio. Nós não queremos que a humanidade inteira dure para sempre. Para que serviria manter um mendigo vivo eternamente? Isso seria um castigo pra ele, concorda?
- Sim, mas...
- Então não podemos permitir que as pessoas sequer imaginem que estamos desenvolvendo esses medicamentos. Eles seriam vendidos apenas para uma parcela muitíssimo seleta da humanidade. É claro que o preço de venda precisaria compensar o número muito inferior de unidades vendidas. Por isso tudo é que definimos que cada comprimido custaria o preço de uma Ferrari nova, e que ele deve ser tomado mensalmente.
- Um único comprimido custaria o preço de uma Ferrari nova?
- Quanto você pagaria para viver para sempre, se pudesse, e se tivesse todo o dinheiro do mundo?
- Hmmm, é, faz sentido.
- Para compensar a baixa produção, precisamos cobrar muito caro a venda de cada unidade. se não, não compensaria sua produção, concorda?
- Certamente. Mas ainda não entendi no que posso ser útil.
- Pense um pouco. Tente adivinhar o que está acontecendo.
- Bom, se várias empresas gigantes estão disputando para ver quem patenteia primeiro o comprimido que garante vida eterna, então deve estar havendo algo como uma espionagem industrial. É isso?
- Exatamente! Vejo que você é esperto. Estamos sendo vítimas de espionagem industrial. Mas o caso é muito mais grave que isso. Uma empresa concorrente contratou um espião, que se infiltrou em nosso quadro funcional e conseguiu roubar uma série de informações de altíssimo sigilo. Informações que não poderiam cair em mãos inimigas em hipótese alguma.
- Entendi. E o que aconteceu?
- Esse espião conseguiu copiar todos os arquivos referentes à produção do medicamento, mas agora está negociando com as duas partes e pedindo uma soma assombrosa para não entregar para a concorrência. Está fazendo jogo duplo e, de um jeito ou de outro, vai sair ganhando um dinheiro inimaginável.
- E querem que eu descubra onde está essa pessoa, é isso?
- Mais do que isso, queremos que você evite de toda forma a possibilidade que esses arquivos venham a ser conhecidos pela nossa concorrência. Não importa se para isso você precise utilizar meios ilícitos e anticonvencionais....
- Você quer dizer, matar o cara?
- Ora, não vamos usar palavras tão agressivas. Mas percebo que você entendeu o recado.
- É, creio ter entendido. Tudo bem, eu topo o caso. Quado começo?
- Já começou. Amanhã esteja aqui às sete da manhã.
A caça
Justo vai à caça do espião, contando para isso com as últimas mensagens recebidas, de arquivos do setor de recursos humanos da empresa e de algumas mensagens trocadas com a diretoria. Pediu para analisar tudo isso em sua própria casa, local onde teria a melhor estrutura para executar o trabalho.
Passou alguns dias rastreando cada passo do suspeito. Entendeu como ele trocava de identidade e local com grande facilidade, apagando seus rastros e tornando sua identificação praticamente impossível. As mensagens eram enviadas de lan-houses com perfis recém criados e os telefonemas eram dados em telefones públicos, cada vez em um lugar diferente do país.
- Com tanto dinheiro envolvido, ele pode fazer isso pro resto da vida...
Justo começou a cruzar as informações e percebeu alguns padrões de comportamento. O grande defeito dos espiões é sempre deixar uma "assinatura" em seus métodos, algum tipo de padrão bastante sutil e de difícil interpretação. No caso, este espião estava indo de uma cidade para outra.... em ordem alfabética!
- Anandeua, Botucatu, Campo Largo, Diamantina, Esplanada, Florianópolis, Guarani... não repete nenhuma letra, nem pula nenhuma. Também sempre muda de estado. Então, qual seria a próxima?
Levantou todas as cidades com nomes que começam por H. Encontrou 21, sendo que três ficavam em Goiás, portanto restariam dezoito. Seis delas ficavam no Rio Grande do Sul, três em são Paulo, duas no Ceará e o restante uma em cada estado. Então, qual estado seria o escolhido?
Verificou que o espião estava sempre escolhendo o estado com o maior número de municípios com a letra escolhida. Portanto, a próxima seria certamente no Rio Grande do Sul. Mas qual?
Com relação ao tamanho da cidade, também havia um padrão: uma pequena, uma grande, uma pequena, uma grande. Então, como Guarani é uma pequena cidade no interior de Minas Gerais, então a próxima seria uma cidade grande. Bom, de todas as seis cidades do Rio Grande do Sul que começam com H, a maior é Horizontina. Uma pacata cidade com cerca de vinte mil pessoas no extremo norte do estado. Não é uma grande cidade, mas é a maior das listadas.
Não valia a pena pegar avião para chegar a Horizontina. Era mais fácil e rápido ir de carro. Em meia hora, já estava na estrada e em quatro horas estava chegando em Horizontina. Agora, precisaria localizar uma lan house. Tarefa fácil, pois no centro da cidade só haviam duas, e ambas com pouco movimento. E próximas. Do quarto do hotel, deixou uma câmera filmando a entrada de uma das lan-houses. Enquanto isso, desceu na praça e ocultou outra câmera, voltada para a outra lan house. Ficou ali, observando discretamente quem entrava e quem saía dos estabelecimentos.
Também prestava atenção nas placas dos carros, procurando especialmente alguma coisa suspeita. Duas horas se passaram sem qualquer identificação de possível suspeito. Começou a caminhar pelos carros estacionados e percebeu um com placa de Chapecó (a mais próxima cidade com aeroporto) e um adesivo de identificação de aluguel de veículos. Era um carro alugado.
Só poderia ser este.
Ficou a uma distância segura e colocou uma terceira câmera oculta, filmando o carro. Nisso, recebe pelo celular uma mensagem do Marlon, informando que acabara de receber um e-mail do sujeito. Rapidamente, vai até o veículo suspeito e fixa nele um detector GPS. Mantém uma certa distância enquanto observa. Um rapaz jovem, de óculos escuros, entra no veículo, confere seu celular e arranca em direção à saída da cidade. Justo entra imediatamente em seu veículo e começa uma perseguição à distância. Enquanto isso, coloca no computador de bordo o sinal do GPS rastreado e as imagens das câmeras ocultas. Consegue tirar uma foto do rosto do suspeito e envia para Marlon para identificação.
- Por acaso esse sujeito aí parece com alguém que trabalha ou trabalhou recentemente na empresa?
- Vou verificar e já retorno.
Em questão de dez minutos, Marlon liga, avisando:
- Sim, temos um funcionário em férias que se parece muito com esse sujeito.
- Qual era o setor dele?
- Limpeza.
- Claro, o pessoal da limpeza tem acesso a toda a fábrica. Muito astuto da parte dele. Quando ele foi contratado?
- Há dois anos. Um ano depois do início do Projeto Highlander.
- Provavelmente todos os dados que vocês têm dele são falsos. Mas vocês têm as digitais dele?
- Hm, deixa ver.... não, não temos não... peraí... algumas salas só permitem acesso biométrico, então pode ser que ele tenha cadastrado sua digital lá, né?
- Brilhante, sr. Marlon.
- Vou pedir para a area técnica verificar.
Enquanto isso, Justo continuava seguindo o veículo à distância. Já haviam atravessado a fronteira estadual e já estavam em terras catarinenses. O celular toca novamente.
- Justo, é o Marlon. Conseguimos a digital do suspeito. Já encaminhei para um amigo meu da polícia federal para tentar identificar.
- Perfeito, Marlon, era justamente isso que eu iria fazer. Estamos nos aproximando de Chapecó. Como é tarde, provavelmente o suspeito vai dormir em algum lugar e amanhã irá para uma cidade que começa com I. Como deve ter umas trezentas cidades que começam com I, precisamos agir rápido.
- Lembre-se que você tem carta branca para fazer o que for necessário. Tente fazer parecer um acidente.
Neste momento, Justo tem um insight e lembra-se de uma cena do filme O Poderoso Chefão. Lembra-se da máfia italiana. E se deu conta de tudo o que estava envolvido e acontecendo. Entendeu com clareza o papel que cada um desempenhava nesse jogo sinistro. Entendeu as regras do jogo.
A situação era complicadíssima: Um laboratório estava desenvolvendo um comprimido capaz de manter uma pessoa eternamente jovem. Por isso o nome Projeto Highlander. Imagine o poder econômico de um laboratório que vende cada comprimido ao preço de uma Ferrari. Claro que somente uma elite muitíssimo restrita teria acesso a esses medicamentos. Quem poderia comprar uma Ferrari por mês? Havia uma outra questão: se todas as pessoas pudessem viver para sempre, a população humana na Terra iria disparar em progressão geométrica, tornando o planeta inabitável em poucos anos. Seria o caos absoluto. Certamente os laboratórios tinham esta clareza, e certamente iriam vender o medicamento a um preço tão alto que somente os mais ricos poderiam comprar. Esse medicamento não poderia ser fabricado em grande escala, senão seria o fim da humanidade. Mas como garantir que a concorrente tivesse esta clareza? E se a concorrente estivesse pouco se lixando pra explosão demográfica e se preocupasse apenas em ficar podre de rica? E se a história contada por Marlon não fosse exatamente do jeito como ele tinha contado? E se...
Justo entendeu o que realmente estava acontecendo.
O espião havia entrado em um posto de gasolina e entrou na conveniência. Justo estacionou seu carro atrás. Ainda estava esperando a identificação do suspeito, mas achou que agora, tanto faz a identidade do espião. Eles precisavam conversar.
O espião estava sentado a uma mesa, fazendo um lanche. Justo serve-se de um salgado, pede licença e senta junto com ele.
- Olá, meu nome é Justo, e o seu?
- Roberto - responde sem dar atenção.
- Sr. Roberto, ou seja qual for seu nome de verdade, você já ouviu falar do Projeto Highlander?
O espião para de comer e fica imóvel por alguns segundos. Tira os óculos escuros e olha diretamente para Justo.
- Não tenho certeza. Por que a pergunta?
- Sr. Roberto, eu fui enviado pelo Laboratório X para evitar a qualquer custo que o segredo industrial mais caro do mundo seja vendido para a concorrente que lhe contratou.
O espião fica imóvel alguns segundos e pede:
- Como é que é? Explica isso direito que eu acho que tem um grande mal entendido nessa história.
- Eu também acho que tem. O laboratório X, a maior fabricante de medicamentos do mundo, me contratou porque supostamente você se infiltrou no quadro funcional para roubar um segredo industrial, a fórmula do comprimido da vida eterna, e supostamente você iria vender essa fórmula para o laboratório Y, ou para quem lhe pagasse mais. Não estou bem certo que esta seja realmente a verdade dos fatos. Isso procede ou não?
- Em primeiro lugar, quem é você?
- Meu nome é Justo. Sou detetive especializado em rastrear pessoas usando alta tecnologia.
- Ah, isso faz todo o sentido. Ok, percebo que você está com boa intenção e deve ter percebido que a história não foi exatamente como lhe contaram. Muito bem, deixa eu lhe esclarecer então.
Roberto toma um gole de café e prossegue:
- Em primeiro lugar, meu nome verdadeiro é Raul. Sou especialista em fraude de identidade. Fui contratado pelo Marlon para roubar a fórmula desenvolvida pelo laboratório Y. Ou seja, é o contrário do que ele está falando. Eu me infiltrei no laboratório Y usando documentos falsos. Trabalhei por dois anos no laboratório Y e finalmente consegui roubar a fórmula. Estou com ela em mãos, mas é óbvio que tenho cópias. Também sou hacker. Eu criei um sistema, no qual devo entrar todos os dias e digitar uma senha. Se errar a senha duas vezes ou se não entrar por dois dias seguidos, o sistema irá disparar um e-mail enviando a fórmula para todos os laboratórios que estão competindo no Projeto Highlander. Entendeu?
- Quer dizer, você criou uma forma de garantir que ninguém o mate, é isso?
- É. E todos os laboratórios sabem disso. Então por que o Marlon, mesmo sabendo disso, ordenou que você me mate?
- Hm, isso realmente não faz muito sentido.
- Claro que faz. Pense bem: seria uma fantástica queima de arquivo. Você me mata, ele recebe a fórmula por e-mail, e não me paga a fortuna que estou cobrando por fazer esse trabalho. Dane-se se os outros vão receber a fórmula também. O laboratório X é o maior do mundo, ele iria lançar o produto primeiro, fabricar em grande escala e não daria espaço para os concorrentes. Simples assim. Entendeu agora?
- Realmente faz todo o sentido. Mas o que faremos agora então?
- Você teve acesso aos e-mails que eu mandei para o Marlon?
- Não. Apenas algumas mensagens. Ele apenas me falou quais foram as cidades de onde eles foram enviados.
- Então você não leu nadinha nadinha do que eu escrevi?
- Não.
- Vem cá. Leia você mesmo os originais:
Raul mostra os e-mails originais em seu smartphone, e Justo compreende que Raul estava falando a verdade. Mas era muito mais do que isso. Havia uma verdadeira conspiração por trás da fabricação desse medicamento. Um grupo de pessoas que queria viver eternamente e manipular a economia, a política, a religião, as informações, enfim, tudo. E para sempre. Um mesmo grupo de pessoas por trás dos bastidores, comandando toda a humanidade.
- Isso é inacreditável. Então esse medicamento foi fabricado por ENCOMENDA?
- Exato. As duzentas pessoas mais poderosas do mundo estão financiando a fabricação deste medicamento, para poderem se manter no poder - e podres de ricas - por toda a eternidade. Na verdade, elas e seus familiares próximos.
- Nesse caso, esse medicamento não é uma bênção, mas uma maldição.
- Exatamente. É por isso que estou me recusando a entregar a fórmula. E fui mais longe ainda: eu consegui apagar a fórmula dos computadores do laboratório Y.
- Ou seja....
- Só EU, no mundo inteiro, tenho essa fórmula agora. Entende por que estão me perseguindo desesperadamente?
- Mas eles podem desenvolver de novo...
- Podem. Mas eu é que não vou facilitar o trabalho deles.
- Então é por isso que você está mudando de cidade cada dia.
- Claro. Se eu parar dois dias no mesmo lugar eles me encontram e me matam. Você foi o primeiro que conseguiu me encontrar, mas graças a Deus foi inteligente o suficiente para perceber que estava sendo usado por eles.
- E o que faremos agora?
A decisão
- No estágio em que as coisas estão, não há volta. Esqueça sua vida anterior. Ela não existe mais. Agora você precisa fugir e se esconder, como eu.
- E por que não destruímos a fórmula?
Raul para e pensa um pouco. E responde:
- Eu tenho a fórmula como um trunfo. Ela está guardada em um local onde jamais vão descobri-la, e criptografada de tal jeito que jamais vão conseguir descriptografar. A bem da verdade, a única forma de conseguir a fórmula é me matando mesmo, pois assim todos recebem a fórmula por e-mail. Bom, vamos rever isso e usar a nosso favor. Que tal?
- Excelente ideia. Veja, fazemos uma dupla que se completa: você é especialista em fraude de identidade e eu sou especialista em rastrear pessoas. Eu garanto nossa segurança, rastreando ameaças, enquato você nos mantém anônimos. E juntos vamos sempre tentar sabotar o plano deles, que tal?
- Muito bem, mas como vamos viver? Comendo a fórmula?
- Você não é hacker?
Raul pensa um pouco.
- É, sou... Mas não pensei em fazer disso uma fonte vitalícia de renda.
- Mesmo se a conta bancária hackeada fosse a dos laboratórios? Ou melhor ainda, dos duzentos aqueles que estão financiando as pesquisas?
- Hmm... é. Fechou. Combinado. E pra onde vamos agora?
- Bom, seguindo a sua lógica, a próxima cidade seria com I agora, né?
- Ah, então foi assim que você me encontrou... parabéns, seguiu corretamente meu pensamento. Você explicou esse padrão pro Marlon?
- Bah, infelizmente sim.
- Então é óbvio que precisamos mudar de padrão.
Justo pensa um pouco:
- Que tal irmos morar em uma ilha deserta?
- Romântico demais. Desculpe mas você não faz exatamente meu tipo. Não é o tipo de pessoa que eu gostaria de viver o resto da vida sozinho numa ilha.
- E se a gente for morar no meio do mato, numa comunidade alternativa, sem acesso a nada, completamente fora do sistema?
- Hmmm.... Assim já melhorou. Alguma sugestão?
- Ao invés de letras, podemos usar números...
- Deixa eu fazer uma pesquisa aqui. Hmmm... que tal a comunidade hare krishna de três corações?
- Perfeito!
- Olha só, já devem ter me rastreado neste momento, já devem saber em qual hotel estou hospedado e vão localizar o meu carro. Você foi com o seu carro no laboratório?
- Sim, por que?
- Então já sabem a placa dele também. Vamos pegar um ônibus. Esperam que a gente chegue em Chapecó, mas vamos dormir em Xanxerê e amanhã seguimos viagem, combinado?
- Combinado.
Três dias depois, dois hare-krishnas de cabeça raspada, com suas togas e incensos, desciam de um ônibus em Três Corações.
Foram recebidos pelo líder da comunidade e iniciaram seus longos retiros de três anos, fechados em eremitérios individuais.
Seus nomes civis? Ninguém sabe. Apenas os nomes espirituais: Hac Ker Das e Ras Treia Das.